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terça-feira, 10 de julho de 2012

Maior vilão da CPI continua intocável: o financiamento privado de campanhas

Hoje mais um político foi alvo na CPI do Cachoeira, o prefeito de Palmas (TO), Raul Filho (PT). Ele foi convocado depois que a turma de Cachoeira plantou no "Fantástico", da TV Globo, um vídeo gravado em 2004, quando o prefeito ainda era candidato e teve um encontro com o bicheiro, onde pediu financiamento de campanha.

O prefeito saiu da CPI conforme entrou: não chegou a se complicar mais, mas também não conseguiu afastar as suspeitas.

Raul Filho repetiu o que fizeram outros políticos que foram à CPI: na sua fala inicial usou o espaço para falar dos sucessos de seu governo, procurando impor uma agenda positiva sobre o desgaste negativo. No resto do tempo procurou se defender, negando as acusações. O próprio relator Odair Cunha (PT-MG) achou que o depoimento não foi convincente e as investigações devem continuar.

Uma falha de todos na CPI é a pouca ênfase no grande mal do financiamento privado de campanhas. É certo que o tema aparecerá no relatório final, mas tanto os depoentes como os inquisidores da CPI pouco exploram o assunto diretamente. Em todas as sessões, o tema deveria estar sendo debatido com profundidade.

Um depoente que seja pessoalmente honesto, poderia até virar o jogo a seu favor, se expusesse com clareza que todo político que disputa cargos mais importantes com chances é obrigado a ter jogo de cintura para captar doações privadas para campanha, ou desistir de concorrer com chances. Mas que, depois de eleito, é uma luta contínua contra lobistas que tentam assaltar os cofres públicos. Quando o governante é corrupto, ele mesmo mergulha de cabeça nos esquemas e enriquece com propinas. Quando não é corrupto, acaba tendo seu governo atacado pelos flancos, além de virar alvo de conspiração dos lobistas, inclusive via imprensa, para derrubá-lo por terem interesses contrariados.

Geralmente os honestos conseguem repelir muitas investidas, mas outras, mais cedo ou mais tarde, acabam conseguindo se infiltrar em setores do governo, mesmo contra a vontade e determinação do governante. Seja através de bancadas no legislativo, indispensáveis para a governabilidade, que nomeiam gente, seja através da corrupção em escalões inferiores do funcionalismo, através do assédio de lobistas.

Sem deixar de cobrar as responsabilidades individuais de cada político ou agente público por seus atos, pouco adiantará apenas aparar as pontas das ervas daninhas, sem cortar o mal pela raiz. Mal resolverá uma pequena parte do problema.



No depoimento de Raul Filho, ele disse que teve dois encontros com Cachoeira. Um é o que foi filmado em 2004, outro foi dez anos antes, em 1994. Segundo ele, foi em Goiânia, apenas acompanhando um candidato a deputado federal conhecido de Cachoeira, com quem fez dobrada como candidato a deputado estadual pelo PFL (*). Ou seja, o próprio Cachoeira já operava em campanhas políticas desde 94, pelo menos, e já passou pela CPI dos Bingos, pela CPI da Loterj no Rio de Janeiro, já teve a operação Vegas "sobrestada" por 3 anos, e finalmente teve a Operação Monte Carlo, que o pegou. Mas não será surpresa se seu nome vier a aparecer de novo, no futuro, articulando nos bastidores, se o sistema de financiamento privado de campanhas continuar como está.

Hoje a empreiteira Delta ocupa o noticiário, ontem foi a Gautama, ante-ontem a Incal. Outras grandes empreiteiras volta e meia aparecem citadas em escândalos, mas seus donos são blindados pela chamada grande imprensa. Enquanto empreiteiras financiarem campanhas políticas, alguém tem dúvida de que outras virão a ocupar o lugar da Delta no noticiário de escândalos?

Na CPI dos anões do orçamento, alguns deputados perderam seus mandatos, mas as empreiteiras corruptoras continuaram intocáveis e financiando campanhas eleitorais. Muitas tiveram obras em consórcio com a Delta.

A CPI deve sim pegar os Perillos, Demóstenes, Leréias, Siqueira Campos, Cavendish, e quem quer que seja que tenha culpa, mas se não pegar o maior vilão de todos, o próprio sistema de financiamento privado de campanhas, que é o adubo que faz nascer e crescer esse tipo de político, não terá cumprido sua missão de desmantelar os esquemas como o de Cachoeira.

Cachoeira é substituível, a Delta é substituível, Perillo e Demóstenes são substituíveis. Todos eles tem peças de reposição quando precisam ser trocados para manter a máquina maior da corrupção funcionando, através da captura de setores de governos via financiamento privado de campanha. O único golpe na corrupção que não tem reposição é mudar o sistema para financiamento exclusivamente público de campanha.


(*) Raul Filho, no PT, sem identidade petista

Em 1982, com 22 anos, elegeu-se prefeito de Araguaçu, pelo PDS (partido de apoio à ditadura, na época).
Em 1988 foi eleito deputado estadual do Tocantins pelo PFL, reeleito em 1990 e 1994.
Em 1996 concorreu à prefeitura de Palmas pela primeira vez, pelo PSDB, ficando em segundo lugar.
Em 2000, nova tentativa à prefeitura sem sucesso, pelo PPS.
Foi para o PT em 2003, elegendo-se prefeito em 2004 e reelegendo-se em 2008.
Em 2011 o PT estadual chegou a expulsar do partido a mulher de Raul Filho, a deputada Solange Duailibe, porque havia anunciado sua ida para o PSD da senadora Kátia Abreu.
O prefeito também chegou a ser expulso por desobediência ao apoiar na campanha de 2010 candidatos adversários do PT no estado. O prefeito e sua mulher recorreram e a expulsão de ambos foi cancelada pelo diretório nacional.

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