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quinta-feira, 21 de março de 2013

Fogo amigo da fulanização, a zona de conforto que empaca a 'Ley dos Médios'

O PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela), criado por Hugo Chávez, detém 55% do parlamento venezuelano (lá é unicameral). Os peronistas, bancada de apoio a Cristina Kirchner na Argentina, tem 54% da Câmara, e tem também maioria no Senado.

No Brasil, o PT já elegeu presidentes da República três vezes, mas tem apenas 17% da bancada da Câmara e 17% do Senado. Somando aos votos do PCdoB, o aliado mais próximo nas votações legislativas, chega perto de 20% em cada Casa.

Como se vê, o PT não tem condições de, sozinho, dar sustentação ao governo, nem de fazer reformas legislativas, como a reforma política ou um marco regulatório das telecomunicações.

É preciso muita conversa e articulação com outros partidos de centro e à direita. É preciso também costurar a redução de resistências de setores da sociedade que influem no voto destes parlamentares. Enfim, é preciso buscar os pontos em comum, aparar arestas, saber ceder também no que pode ser cedido, para construir maioria.

Daí, não dá para entender por que o PT, junto com o PCdoB, não propõe um texto de "Lei dos Medios" no Congresso, da mesma forma que faz com a proposta de reforma política do deputado Henrique Fontana (PT-RS), para colocar em pauta, em discussão, consulta pública, chamar os mais diversos setores para audiências públicas, e costurar condições mais favoráveis para aprovar o que for possível.

O PT quer a reforma política e foi à luta para costurar acordos. Está tentando, está fazendo a coisa certa. O partido não se limitou a ficar na zona de conforto, escrevendo resoluções partidárias empurrando o problema para o ministro da Justiça, por exemplo, fazer um projeto e empurrar goela abaixo do Congresso. Porque está cansado de saber que nenhum ministro é "salvador da Pátria" de uma reforma política que precisa de muito mais do que os 20% de votos que o PT e o PCdoB tem no Congresso.

Da mesma forma acontece com uma lei tão sensível ao interesse da grande maioria de parlamentares dos outros partidos, como a chamada "Ley dos Médios". Não faz o menor sentido o PT ficar na zona de conforto escrevendo resoluções partidárias, "fulanizando" o problema no nome de uma única pessoa, o ministro das Comunicações Paulo Bernardo (PT-PR), como se dependesse unicamente dele ou da presidenta Dilma "salvar a Pátria", sendo que os únicos votos no Congresso com que pode contar, neste caso, são os 20% do PT e do PCdoB.

O PT sabe que a aprovação de uma lei destas não depende de um único ministro, seja quem for. Por isso fulanizar o problema é fugir dele. Escrever resoluções empurrando o problema para um ministério só serve para marcar posição, mas não passa de falta de iniciativa partidária para viabilizar de fato alguma lei.

O governo Lula propôs em 2004, a criação da ANCINAV (Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual) e do CFJ (Conselho Federal de Jornalismo), que tinha a ver com algumas propostas da chamada "Lei dos Médios". Sofreu enorme reação e não teve apoios suficientes para levar adiante. O governo, então, só avaliou oportuno voltar a tratar de nova regulamentação da mídia, no final de 2010, já no fim do mandato de Lula. O então ministro da Comunicação Social (SECOM - não era o Ministério das Comunicações), promoveu um seminário e estudos sobre o assunto. Deixou essa pauta para o governo Dilma. Houve manifestações do governo, inclusive do ministro Paulo Bernardo, favoráveis a um novo marco regulatório. Aparentemente, o governo ao estudar o assunto e avaliar a receptividade do Congresso, não viu chances de um bom projeto passar. Ou apresentaria um bom projeto, como desejamos, para não ser aprovado, ou teria que ceder tanto, para ser aprovado, que continuaria tudo como está. Ora, então não adiantaria nada fazer pirotecnia só para jogar para a plateia militante, em vez de dedicar os esforços de governo em projetos viáveis, também transformadores da realidade das pessoas e da nação, sobretudo perseguir a universalização da banda larga veloz e de qualidade para todos.

Logo, essa pauta de regulamentação da mídia ficou inviável no âmbito do poder executivo, no momento atual, assim como não foi viável durante os 8 anos do governo Lula.

Mas nada impede que PT e PCdoB apresentem Projetos de Lei no Congresso Nacional, e procure costurar acordos para viabilizá-los. Se não conseguir aprovar nesta legislatura, pelo menos mantém o debate acesso, aberto à sociedade, com transparência, com um texto objetivo para ser discutido, sem a velha mídia ficar deitando e rolando em cima do nosso vácuo, dizendo que nossas propostas de democratização das comunicações é censura.

O fogo amigo que enfraquece o próprio PT

Grupos de militantes que insistem em reduzir o debate do marco regulatório das telecomunicações à fulanização (o que despolitiza e empaca iniciativas), ficam frustrados pelo governo Dilma não colocá-lo em pauta (quando, na atual conjuntura, quem deve fazer isso são os parlamentares), e passam a descarregar fogo amigo contra qualquer outra iniciativa do ministério das Comunicações.

Há críticas completamente infundadas e que mostram profundo desconhecimento. Fazer política industrial para incentivar fabricas de produtos de rede no Brasil, com alto valor agregado de tecnologia, é criticado de forma até ingênua como se fosse "doar dinheiro às teles".

Buscar aumentar a taxa de investimento sobre o PIB num dos setores mais dinâmicos da economia e que mais tem potencial de crescimento, também vira motivo de outras críticas ingênuas como se fosse "doar dinheiro às teles".

Tem críticos até defendendo que as teles fiquem até 2025 sem trocar por fibras óticas os velhos fios de cobre para telefonia que chegam na sua e na minha casa, e que tem limitações técnicas de velocidade para banda larga, só para as teles devolverem essa rede ao governo, sendo que será sucata até lá... senão acusam de "doar dinheiro às teles".

Obviamente que se as teles tiverem que devolver estas redes antigas em 2025, elas vão estender a vida útil dos cabos antigos e evitar trocar o quanto puderem. Se o governo abrir mão dessa devolução, que terá valor de sucata em 2025, contanto que troque por fibra ótica, quem ganha é você, eu e todo domicílio do Brasil. É claro que um projeto deste precisa ser muito bem alinhavado, mas não há como ser contra se for bem feito, focado no interesse do cidadão e no real patrimônio público. Em 2025 o Brasil já vai ser outro, a Telebras já será outra. A página da Privataria Tucana nas teles já estará virada há tempos.

Com os investimentos em andamento, inclusive da Telebras, o governo Dilma e o Ministério das Comunicações terão muito o que inaugurar até o ano que vem, e os resultados destes avanços serão conquistas do governo do PT, de um ministério cuja gestão é do PT. Muita gente que hoje dispara fogo amigo, estará queimando a língua, usando as conquistas no setor de comunicações como bandeiras de campanha para se reeleger em um ano eleitoral.

Aliás, nada contra o PT ter tendências e debates internos, o que até é bastante saudável para a democracia interna e para a vitalidade do partido, mas essa esquizofrenia de disparar veneno a esmo contra seus próprios ministros, minando suas lideranças políticas, sem nenhuma razão objetiva, só serve para atrapalhar o crescimento da bancada no Congresso, formando um ciclo vicioso, pois sem bancada maior não há meio de transformar algumas resoluções do partido em leis.

4 Comentários:

Eduardo Guimarães disse...

Zé Augusto, mas precisava a Dilma e o Paulo Bernardo encamparem o discurso do PIG de que o único controle que querem é o controle remoto? Veja, eles não dizem "eu quero, mas não posso". Dizem exatamente o que vêm dizendo dez entre dez reacionários de ultra direita. Eu sei que é difícil, que o PT não tem maioria e até acho que se esse projeto for enviado ao Congresso, não passa nem que chova canivete. Todavia, meu caro, o que o ministro das Comunicações e a presidente da República estão fazendo é dizer que o PT quer censura. Um abraço do Eduardo Guimarães

Ralf R só-a-consciência-no-ato-salva! disse...

NO MÍNIMO, está faltando empenho e/ou competência do governo federal em explicar suas intenções e estratégias com suficiente clareza para o público em geral, e para o próprio partido a quem deve o poder. Isso não pode ser função de blogs independentes, tem que partir do próprio governo. E não tenho como não dizer que comunicação, TAMBÉM NESSE SENTIDO, não tem sido o seu forte.

Ah, sim, além de se expressar com clareza, cabe sim ao governo OUVIR o partido e responder com o respeito devido entre companheiros, o que o Sr Bernardo não soube fazer. Só vira fogo quando as tentativas de diálogo não são acolhidas e respeitadas. Nossa função enquanto partido é UM POUQUINHO MAIS que apenas viabilizar sua ascensão até os seus cargos, meus caros.

Zé Augusto disse...

Eduardo, de todas as declarações que vi e li, o Bernardo sempre se posicionou favorável ao marco regulatório da radiofusão, ele só tem ressalvas quanto as condições políticas desfavoráveis. Quanto a Dilma, ela tem a característica diferente do Lula. Ela fala pouco, mas quando faz uma coisa é pra vencer, como nos juros e na conta de luz. Eu também sou crítico deste estilo do governo ficar muito silencioso sobre alguns temas, mas do ponto de vista do governo a popularidade da Dilma está cada dia mais alta, então eles devem pensar que não deve mexer em time que está ganhando (mesmo que não esteja jogando bonito aos nossos olhos).
Quanto ao Congresso acho que está complicado até para a bancada do PT apresentar um projeto de lei dos médios, sem preparar bem o terreno antes. Imagina o que 80% do Congresso inclinado para o lado do PIG iria fazer: ia fazer um desmanche no projeto e colocar emendas do jeito que o PIG quer, consolidando os interesses deles. Se a bancada ruralista desafiou as pressões populares no código florestal, imagine o que 80% do Congresso não iria fazer com uma Lei dos Meios do jeito que a gente quer. É preciso traçar uma estratégia melhor para a gente não dar tiro no pé. Acho até que devia fatiar um pouco as coisas. Direito de resposta ser um projeto de lei à parte (até já tem um do Requião) porque atinge imprensa escrita também que não é concessão, regular radiofusão outro porque é concessão, neutralidade da internet outro. Assim fica mais viável formar maiorias para aprovar questões pontuais, uma a uma. Abraços.

Zé Augusto disse...

Ralf, concordo com você que o governo precisa dialogar mais com as bases e com os movimentos sociais. Sinceramente, eu acho o ponto mais fraco do governo hoje`é a Secom. Pessoalmente não tenho nada contra a ministra, acho que ela é leal à Presidenta (o que é importante) e tem competência profissional, mas a gestão está técnica demais, despolitizada, concentrada, e com visão de mídia do século passado. Devia dar uma atenção nestes pontos fracos. O problema é que com a popularidade da Dilma alta do jeito que está, eles não mudam a linha, porque é igual time que está ganhando.
Quanto ao fogo amigo, acho que foram várias críticas que foram acumulando, até dar ruído.
O ministério das comunicações está cumprindo muitas políticas do programa do PT: cidades digitais, regularizar rádios comunitárias,
ter a Telebras para a comunicação estratégica,
de segurança nacional, para garantir o PNBL
para todos e para competir com as teles
privadas no futuro. Além disso, mesmo não
achando bom, o caminho mais rápido para levar
banda larga a todos, passa pelas teles privadas. Não tem saída, do jeito que o Brasil é hoje.
A Telebras para virar uma Telefonica ou uma Oi, atendendo no varejo em larga escala, hoje teria que investir mais de centena de bilhões e mesmo assim, leva alguns anos para licitar, licenciar, instalar.
Se há falhas no governo, também acho que há falhas no PT ao não incluir nas resoluções para os prefeitos do partido aderirem ao projeto de cidades digitais, por exemplo, nem de contratarem a Telebras onde já tem rede disponível. Em Anápolis, a prefeitura
trocou um link da tele privada pelo da Telebras
2,5 vezes mais rápido pelo mesmo preço. Se todas
as cidades que o PT e aliados administram fizerem isso, fortalece a Telebras. É mais efetivo do que uma resolução vaga dizendo defender o fortalecimento da estatal.
O PT também errou na incompreensão das desonerações da industria de equipamentos para as teles. É uma política industrial, feita em comum com outros ministérios, e houve diálogo antes com lideranças do PT para o lançamento do plano Brasil Maior. O senador Walter Pinheiro (PT-BA) que foi sindicalista da área de telecomunicações entendeu e apoia as desonerações para construir redes.

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